Leia detalhes do processo criminal aberto na Justiça contra representantes do laboratório PCS Saleme, envolvido na contaminação por HIV de pacientes transplantados.
A Justiça aceitou a denúncia do MP contra cinco pessoas: Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, Walter Vieira, Adriana Vargas dos Anjos, Ivanilson Fernandes dos Santos, Cleber de Oliveira dos Santos e Jacqueline Iris Bacellar de Assis
Os réus teriam se associado entre si e/ou com outros indivíduos ainda não identificados´e cometeram o crime de lesão corporal de natureza gravíssima contra pelo menos em pacientes receptadores de órgãos, que foram contaminados pelo vírus HIV bem como inserido, também em tese, declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita em laudo com resultado falso negativo para sorologia anti-HIV.
Além disso, a denunciada Jacqueline Bacellar teria, supostamente, falsificado documento particular, referente ao seu diploma de graduação no curso de Biomedicina.
Segundos os autos, entre os dias 01/12/2023 até 09/2024, no interior do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda ou PCS LAB Salema) os denunciados estariam cientes de que o controle de qualidade da sorologia para a realização dos exames de anatomia patológica deveria ser realizado diariamente para evitar resultados falsos, contudo, a partir do início do ano de 2024, o controle de qualidade dos exames passou a ser realizado de forma semanal, no intuito de reduzir os custos dos exames,
Frise-se que era de possível conhecimento dos acusados, diante das funções exercidas em suas atividades, de que os reagentes ficam degradados por permanecerem muito tempo na máquina analítica utilizada no laboratório, bem como os pacientes receptores de órgãos transplantados recebem imunossupressores para evitar a sua rejeição, de modo que eventual aquisição de qualquer doença em um organismo já fragilizado, principalmente HIV (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), seria extremamente danoso ao receptores.
Cientes da probabilidade de um paciente ser contaminado, teriam os acusados, em tese, emitido e/ou anuído com a emissão de laudos com falso negativo para sorologia anti-HIV, indiferentes à transmissão de doenças aos pacientes transplantados, o que inclui a transmissão do vírus da Imunodeficiência Humana, o que, via de consequência, lhes causaria enfermidade incurável.
As supostas irregularidades praticadas no Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., o Estado do Rio de Janeiro, por meio da Fundação Saúde (FSERJ), contratou a sociedade empresária para a realização de exames de análises clínicas e de anatomia patológica em unidades de saúde sob a sua gestão, incluindo a Central Estadual de Transplantes, pelo período de 12 (doze) meses, conforme contrato nº 571/2023 celebrado entre os sócios da mencionada pessoa jurídica (PJ) e o ente público, pelo valor de R$ 9.799.836,03
O denunciado Walter Vieira é o o sócio administrador do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., sendo o responsável por conferir, assinar e liberar o laudo com resultado falso referente à análise clínica efetuada na amostra dos doadores de órgãos, autorizando implantação em pacientes, tanto que, em 23/01/2024, foi emitido um laudo pelo acusado com resultado negativo para sorologia anti-HIV e o órgão doado foi transplantado durante cirurgia realizada no Núcleo de Transplante Cardíaco da Rede D¿OR.
Inclusive, o réu teria, em tese, ordenado a alteração nos protocolos de controle de qualidade nos equipamentos de análises clínicas instalados nas unidades operacionais da PJ, que funcionava no Instituto Estadual de Cardiologia Aluísio de Castro (IECAC),
Matheus Sales é sócio do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda. e indicado pelo Ministério Público como o responsável pela área de Tecnologia da Informação com acesso privilegiado e ilimitado a todo o sistema informatizado utilizado no laboratório, com autonomia para manipular documentos, incluindo possível descarte de documentos a partir da publicização dos fatos pela imprensa, consoante declarações prestadas em sede policial
A acusada Jacqueline era empregada do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., na função de supervisora administrativa e analista responsável pela conferência dos resultados de exames, tendo, supostamente, apresentado documentação falsa que lhe atribuíra a qualificação de biomédica.
Há relatos de que a acusada, em 25/05/2024, teria emitido um laudo com resultado negativo para sorologia anti-HIV e, posteriormente, a médica de transplante renal da Rede D¿Or teria notificado formalmente a CET/RJ, por e-mail, informando que um dos receptores dos rins obteve teste positivo para o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV),
A acusada Adriana Vargas também é empregada do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., atuando na unidade operacional IECAC na função de coordenadora e supostamente teria partido dela a ordem para modificar os protocolos de controle de qualidade dos exames.
Ivanilson Fernandes é empregado do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., sendo técnico de laboratório concursado do Estado do Rio de Janeiro e atuando na unidade operacional IECAC, como responsável pelas análises clínicas que resultara nos laudos falsos, ciente de que o controle de qualidade da sorologia até dezembro/2023 era realizado diariamente, mas, em janeiro/2024, teria sido alterado irregularmente para semanal, para contenção de custos, sendo indicado como o responsável por digitar, de maneira errônea, o resultado de exames no sistema, c
O acusado Cleber de Oliveira é outro empregado do Laboratório de Análises Clínicas – Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda e atuava na unidade operacional IECAC, na função de coordenador de Nível Superior de Biologia, sendo o responsável pelas análises clínicas que resultaram nos laudos falsos.
Ele foi indicado como o responsável por não efetuar o procedimento de checagem dos equipamentos em que eram realizados os testes de HIV, consoante aos relatos em sede policial.
Para a Justiça. não parece se tratar de erro pontual causada exclusivamente por erro dos empregados do laboratório, haja vista, como pontuado pela presentante ministerial,
“Além de uma série de exames com resultados falsos, as filiais da empresa não possuíam sequer alvará e licença sanitária para funcionamento. O relatório de inspeção da vigilância sanitária anexado nos autos constatou 39 não conformidades, entre elas a presença de sujeira, de insetos mortos e formigas em todas as bancadas do laboratório”; como também, existem “ações indenizatórias propostas contra o laboratório.
Desse modo, verifica-se que o ‘modus operandi’ da conduta perpetrada revela comportamento perigoso e alheio aos princípios de convivência e solidariedade humana, uma vez que os réus estariam, em tese, associados com o fim de incluir informações falsas em laudos médicos que culminaram na transmissão do vírus HIV, enfermidade incurável, em receptores de transplantes de órgãos, em programa realizado pela Secretária de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, o que demonstra a necessidade de se preservar a ordem pública pela gravidade concreta dos delitos imputados.
Para a Justiça, a conduta dos denunciados, supostamente envolvidos na propagação de enfermidade incurável em receptores de órgãos, fragiliza todo o sistema de transplantes do Brasil, fazendo com que diversos órgãos das esferas federal e estaduais venham a reavaliar procedimentos para proteger o Sistema de Transplantes e o Sistema de Saúde, no intuito de resguardar a segurança dos pacientes da rede de saúde.
De acordo com o TJ-RJ, o modo como o crime foi cometido, revelando a gravidade em concreto da conduta praticada, constitui elemento capaz de demonstrar o risco social, o que justifica a decretação da prisão preventiva de todos os envolvidos.
A prisão também é necessária uma vez que haverá ainda, durante a instrução processual, a inquirição de testemunhas sobre as supostas práticas criminosas, de modo que, em liberdade, os acusados poderiam colocar em risco a produção probatória, por meio de ameaças e destruição de provas relevantes, ressaltando que há indicação nos autos acerca da exclusão de mensagens de aplicativo